Porto Alegre, 28 de junho de 2011. Iniciamos a montagem de Ópera dos Vivos na Terreira da Tribo. É uma viagem tornada possível graças à vontade e ao trabalho do Ói Nóis Aqui Traveiz.
Sérgio de Carvalho é dramaturgo e encenador da Companhia do Latão, grupo teatral de São Paulo, Brasil. É professor livre-docente na Universidade de São Paulo na área de dramaturgia.
Porto Alegre, 28 de junho de 2011. Iniciamos a montagem de Ópera dos Vivos na Terreira da Tribo. É uma viagem tornada possível graças à vontade e ao trabalho do Ói Nóis Aqui Traveiz.
A procura da interação entre o velho e o novo possibilita ao escritor ver nas coisas o seu processo. Todo o teatro de Brecht é atravessado por imagens de anacronismos e progressos, momentos da contradição entre atitudes antigas e novas, formas distanciadas de se compreender os padrões da atualidade. Numa nota de trabalho a respeito de A Boa Alma de Setsuan ele escreve: “Claro que já existem aviadores e ainda existem deuses neste Setsuan”.
Princípios – A peça retrata bem os anos 1960, 1970, aquele período de ditadura militar, com um olhar atual. Mas também aborda outras questões. Afinal, qual o tema central de Ópera dos Vivos?
Sérgio de Carvalho – Para nós, a peça é sobre o trabalho da cultura na atualidade. Ela usa os anos 1960 como uma referência para pensarmos possibilidades hoje de relação entre arte e política. Ela não se pretende uma história geral do período. O ângulo em que a história surge em cena é o do processo de mercantilização e de alienação, ligado à especialização em que o trabalho artístico se envolve com o desenvolvimento das estruturas produtivas. Como em qualquer outra relação de trabalho, também as da cultura se determinam pela situação material.
A penúltima peça de Henrik Ibsen estreou em Paris, em 1897. Hoje um dos menos conhecidos entre seus dramas modernos, John Gabriel Borkman é lançado no Brasil com tradução direta do norueguês feita por Fátima Saadi e Karl Erik Schollhammer. O título dá seqüência à coleção Teatro da Editora 34 iniciada com O Pequeno Eyolf, peça imediatamente anterior no conjunto da obra do dramaturgo. Olhando o cartaz dessa primeira apresentação parisiense de John Gabriel Borkman, vemos em primeiro plano o rosto de um homem velho de suíças, como que pairando no ar.
Algumas das mais importantes experiências do teatro latino-americano nos anos 60 e 70 ocorreram no ambiente de grupos teatrais. Esses conjuntos do passado associaram criação coletiva e politização da pesquisa formal. Romperam com a especialização do trabalho artístico e atuaram nas fronteiras do mercado de artes. Nas décadas seguintes, houve um relativo abandono desse projeto coletivista e politizado devido a vários fatores: perseguição da ditadura militar, globalização econômica, retração do campo socialista etc.
Num texto irônico de sua juventude, Marx elogia o erotismo e o senso ético da Bolsa de Valores, porque afinal, ele escreve, na “bolsa de valores também é o amor que impera”. A bolsa de valores é um lugar onde cada investidor busca satisfazer o seu desejo de felicidade, o que significa, na prática, o amor. Portanto, se alguém joga na bolsa, diz ele, “e faz isso com correção”, sabendo calcular bem as conseqüências das operações, está agindo moralmente, ao mesmo tempo em que realiza o amor.
Essa ironia literária de Marx – essa piada de que o mercado é um lugar de moralidade e erotismo – serve até hoje como uma espécie de modelo modernista para a representação teatral antiburguesa.
O debate sobre a extinção da Lei Rouanet tem mobilizado setores importantes da sociedade brasileira. Parte da classe artística, secretários de governo e jornalistas têm assumido o ponto de vista “reformar, sim, acabar, nunca!”.
Como você chegou à direção teatral?
Comecei meu trabalho teatral como dramaturgo. Apesar de algumas experiências anteriores em direção (feitas na universidade, durante a graduação e o mestrado), minha intenção era seguir apenas escrevendo ficção e teoria. Decidi me dedicar ao ofício de encenador quando entendi, através da prática experimental, a possibilidade de juntar os campos. Passei a me dedicar a uma dramaturgia crítica da cena, ligado a um coletivo de artistas, a Companhia do Latão.
A primeira menção documentada ao Auto da pregação universal indica esse objetivo. A peça foi escrita a pedido de Manoel da Nóbrega para substituir uma comédia popular mais grosseira, certamente feita a partir de um folheto de cordel, que costumava ser representada pelos colonos na igreja em épocas festivas. É o próprio Anchieta (1945) quem relata sua motivação: “E por impedir alguns abusos que se faziam em autos nas igrejas, fez um ano com os principais da terra que deixassem de representar um que tinham, e mandou-lhes fazer outro, por um Irmão, a que ele chamava Pregação Universal […]. E a gente movida com muita devoção ganhou o jubileu, que era o principal intento da obra. (p. 18)”
Nos dois primeiros dias de outubro do ano de 1550, na cidade francesa de Rouen, França, ocorreu uma grande festa pública para saudar o rei da França. Foi a primeira vez em que um grupo de índios tupinambás do Brasil atuou num espetáculo na Europa, “representando” (se é que a palavra é essa) a si próprios. Ainda que existam registros anteriores da presença de nativos do Novo Mundo em festas públicas – como a entrada de Luís XII, em 1508, na mesma Rouen –, em 1550 os índios não foram exibidos apenas como curiosidades públicas, como atrações de feira. Eles participaram ativa-mente de uma cena narrativa, e que pretendia reconstituir uma certa imagem de sua vida tribal no Brasil. O evento se tornou conhecido entre nós desde que o historiador Ferdinand Denis, no começo do século XIX, divulgou os relatos e batizou o episódio como “uma festa brasileira celebrada em Rouen” (2007). A encenação de Rouen foi organizada como uma tradicional entrada triunfal (ou entrada “alegre” ou “solene”), que ocorria quando um rei visitava uma cidade em ocasiões especiais. Como se sabe, é uma modalidade de espetáculo público que se originou na Antiguidade e foi, de certo modo, reinventada na Europa do século XIII como festa de confirmação do poder monárquico diante dos súditos e vassalos, num tempo, o século das catedrais, de grande crescimento da vida urbana.
(LEIA O ARTIGO COMPLETO PUBLICADO EM http://www.revistas.usp.br/salapreta/article/view/140221/137198)